terça-feira, 24 de novembro de 2009

Elva, com V*

Emanuel Vieira é o mais rebelde de uma família de quatro irmãos, por isso o mais querido. Foi apelidado de Bibelô quando criança. É um narcisista. Dizem que pessoas do signo de Leão são assim mesmo. Em 1986, quando a companheira engravidou, Emanuel queria homenagear a si mesmo dando a criança seu nome. Nos exames de pré-natal descobriam que vinha uma menina. Ele rapidamente resolveu o problema: pegou as primeiras e últimas letras do nome e sobrenome e batizou como Elva. A mãe tratou de procurar no livro de bebês o significado da palavra. Pra surpresa do pai, Elva já existia. Deriva de Elfo, origem germânica. Assim como na palavra de origem, significa duendes, gnomos e fadas. Alguém que é criativa e espontânea. Possui muita inteligência e alto poder de comunicação e sempre vive no mundo da lua por pensar demais.

Quando Elva se apresenta, a maioria se surpreende. Acham o nome incomum. Geralmente retrucam: “Elva?”. Sim, Elva. Irrita-se com atendentes de telemarketing quando insistem em chamá-la de Dona Elza ou Elba ou Elga. “Não. Elva, com V”, responde. Já se acostumou quando a mãe confunde seu nome com o de sua irmã, a Elma. A Elma se chama assim porque a mãe quis que caçula tivesse alguma ligação com o nome da irmã mais velha, com o dela (Elaide) e conseqüentemente com o do pai. Mas isso já é outra história.

Sempre que Elva conta de onde vem seu nome, as pessoas geralmente dizem que tem tudo a ver, que ela não poderia se chamar de outra forma. Primeiramente porque ela é a cópia do pai: alva, inconstante, informal, assustadoramente complicada, porém doce. Possui todos os traços da tradicional família Vieira, diferentemente da irmã mais nova, que puxou mais para a família da mãe.

Genéticas à parte, Elva se derrete toda quando elogiam seu nome. Para ela, ter nome fora do comum já é um grande elogio. Quando a comparam com os Elfos é que ela gosta mais. Eles são pequenas divindades da natureza, bonitos e iluminados, seres sensíveis com poderes mágicos. A literatura diz ainda que os Elfos sejam amantes da música, da dança e das artes. Como não se lisonjear com tamanho elogio? Mas a Elva ainda possui uma peculiaridade que a aproxima ainda mais do arquétipo desses seres. Tem a orelha saliente e meio pontuda e não as esconde, como a maioria das mulheres de orelhas engraçadas faz.

Para fazer alusão à origem do seu nome, ela tatuou uma fada nas costas. Quando Elva prende seus cabelos vermelhos em forma de coque, a fada - que também possui os cabelos assim - fica à amostra. Quem olha para as costas dela, vê que a fada também está de costas, olhando para cima, sentada grama, contemplando uma lua que se esconde na nuca da moça. A Elva pensa ainda em tatuar mais um gnomo e um duende. Vai fazer de seu corpo uma verdadeira floresta encantada.

Fica indignada em saber que existam outras Elvas no mundo. Inclusive Elvas é o nome de uma cidade em Portugal. Na cidade de Belém, onde mora a Elva, existem dois edifícios com o nome dela: Torre de Elvas e Quinta de Elvas. Há algum tempo descobriu pela internet que existe ainda uma localidade na Itália com seu nome. Ela na verdade, prefere imaginar que todos os locais com seu nome seja seu território a confessar que antes dela o nome já existia. Constatou mais de 1000 Elvas na pesquisa do Orkut. São tantas Elvas que ela se recusa a aceitar o plural de seu nome. Elva é apenas ela, mais ninguém.

Mesmo criança, jamais quis mudá-lo. Na escola, os coleguinhas não a chamavam pelo nome e sobrenome. Era apenas a Elva. E ela achava muito legal, porque eu não queria que a chamassem de “Pinto”. Apenas na hora da chamada a professora dizia Elva Pinto Vie... E antes terminar o Vieira a risada era geral. Ela queria sumir nesses momentos. Baixava a cabeça envergonhada, levantava a mão e apenas balbuciava “presente!”. Passou muito tempo de sua vida achando que as professoras gostavam de tirar barato com o sobrenome dela. Não entendia pra quê diziam o nome todo, se ela sempre foi a única Elva da escola...

Esqueceu a paranóia com o “Pinto” depois que cresceu. “Até que ter um Pinto não é má idéia”, sempre brinca. As formalidades e a possibilidade de outro alguém com o mesmo nome fez com que Elva adotasse o sobrenome Vieira para as assinaturas. Acha mais bonito, mais forte e até mais sério. Elva Vieira. Soa bem.

Ainda sim, gosta de acreditar que ela seja um reflexo de seu nome. Gosta mesmo. Mesmo que toda essa história de origem de nomes seja pura ilusão, isso contribui para deixar o mundo da Elva mais encantado. Ela se identifica com seu nome. Não se imagina sendo chamada de Luciana, Amanda, Priscila ou qualquer um desses comuns. Ela é a Elva, com V.


*Trabalho apresentado à disciplina de Narrativas sobre a origem e significado do nome. Ficou engraçado, mereceu a postagem.

quarta-feira, 18 de novembro de 2009

"Eu sou a Filha da Chiquita Bacana...

... nunca entro em cana porque sou família demaaaaais. Puxei à mamãe..."

Hoje passei o dia escrevendo meu novo projeto de pesquisa. E sabe, adorei ter trocado de tema. Não tem nada mais paraense do que o Círio e não tem nada mais Elva do que a festa dos excluídos, dai a gente junta os dois e a gente entra em êxtase! Chama Dionísio, diga pra ele me trazer um vinho pra comemorar que tá ficando lindo, lindo!
To fazendo tudo com muito empenho e carinho e é claro com aquele Sazon, pra ficar bem gostoso! Quero mesmo fazer esse registro de narrativas e contar a história por meio das experiências dos outros. É isso. Vou construir minha história com a história dos outros. O círio é mesmo um Carnaval Devoto, como estou lendo em um livro do Isidoro.
A música do Caetano demostra muito bem esse contexto: é religião, carnaval, ieieie, iaiaia, e tudo mais. E por falar nisso, ainda pouco estava cantando essa canção, e justamente na hora em que eu cantei alto que puxei à mamãe, a minha mãe disse que sou mesmo a filha da Chiquita Bacana. Não por eu ser homossexual, apesar de defender essa classe com unhas e dentes, nem por ser assídua dessa festa, porque realmente não sou. Mas porque quando minha mãe nasceu, em fevereiro, carnaval, passou um carro som tocando bem alto "chiquita bacana lá da martinica..." e o apelido ficou. Ela é a Chiquita Bacana, então eu sou a filha da Chiquita Bacana. Bom, coincidência ou não, me sinto mais Chiquita por isso. Ainda mais agora mergulhando nesse mundo louco e profano (ou sagrado?) dessa festa tão nossa!
Entre stress, travadas, cigarros, muita leitura e insistência para entrevistar meus personagens volto ao meu projeto. Até!

terça-feira, 27 de outubro de 2009

Festa da Chiquita na Berlinda

Por Elva Vieira (elvavieira@msn.com)

Semana passada, em conversa com a minha orientadora decidi trocar de objeto de pesquisa. Um dos grandes motivos pelo qual resolvi fazer esta troca está no fato de que as festas trance em Belém estão cada vez mais escassas*
e as que existem não tem dado muita gente, portanto, não tenho como fazer as pesquisas de campo para embasar uma dissertação de mestrado. Então troquei as cartucheiras pelo salto de 15 cm. O urucum pela make up pesada. O psy pela piranha do banheiro. Troquei as raves pela Festa da Chiquita. Sim, isso mesmo. E se você pensa que uma coisa não tem nada em comum com a outra, está enganado.

Não gosto do que é moralmente bem aceito pela grande massa. Gosto dos marginalizados pela sociedade, daqueles que festejam a vida diante dos olhos de uma sociedade homogeneizante, cheia de hipocrisia. Meu negócio é festa. É sair de casa para o encontro de um grupo que ri, grita, dança, canta. É renegar as formas políticas pelo humor, pelo escárnio. A revolução não é mais aderir a partidos políticos para mudar o mundo. É festejar. É mostrar que o mundo pode ser melhor e mais unido se nos juntarmos e festejarmos. É agregar. Todo mundo junto e misturado. É não ser mais um corpo individual e sim coletivo. Ah, e como eu gosto do coletivo. É dizer não às regras do estado, da igreja e mostrar a eles como o grupo tem poder e valor social. É ser mau visto e não ligar para isso.

Festa é religião, sim. Inclusive, alguns pesquisadores afirmam que a religião deriva das festas. É sagrada e não profana como as autoridades insistem em dizer. É um momento mágico e extraordinário no qual o indivíduo vai ao encontro de um mundo paralelo, onde a energia vem de todos os lados e transforma. A religião, assim como a festa é um produto social. Onde a verdade pertence ao grupo e a partir dela que se canalizam energias. Um ritual, assim como as festas dionisíacas, como o Círio de Nazaré, como os festivais de música eletrônica, como o réveillon, carnaval, páscoa. Não me excomungue por colocar em pé de igualdade algo que no primeiro momento parece ser distinto, porque não é.

Tenho dedicado meu tempo e atenção a isso. Que coisa maravilhosa é você festejar, pois são os momentos festivos que te dão o gás necessário para continuar vivendo. E vivendo em sociedade. Durante a semana o homem trabalha, rala o dia todo, está muito ocupado com o cotidiano, com as contas, com o emprego, com o estudo. Quando ele está numa festa não. Ele brinca, brinda, volta a ser criança. Vive a magia de estar na companhia do outro, ainda mais se esse outro for alguém que compartilhe suas idéias e anseios.

Por isso estudo o comportamento e a comunicação do corpo coletivo nas festas, por encontrar nelas a razão para o homem continuar a ser homem. E ser humano é ser social, então não tem como eu querer estudá-lo sem estudar os fenômenos sociais que os rodeiam.

Na verdade estou muito feliz em trocar de objeto de pesquisa. E ansiosa pelo resultado final do trabalho. Vamos ver no que vai dar...




Trailler do Documentário "Filhas da Chiquita" (Priscilla Brasil, 2006)





*Acho que não estou assistindo à morte da cena da música eletrônica em Belém, apesar de ter certeza que o movimento trance aqui perdeu muito da sua força. Com a perda desse movimento, o grande público se dispersou, "enjoou" das festas e do formato dela. Quem pode faz melhor: curte os festivais pelo Brasil. O fato é que ainda temos muita gente que simpatiza com as festas rave na cidade, mas não aguenta a mesmice. E quando eu falo de rave me refiro mesmo àquelas feitas em sítio, cujo público é quem gosta mesmo dessas festas e da música. Acho que estamos passando por uma transição, na qual o público está a espera do próximo hype, da próxima vertente, do próximo diferencial nas festas da cidade...

sábado, 3 de outubro de 2009

por Elva Vieira (elvavieira@msn.com)

Meu contato com a semiótica sempre foi intenso, desde o princípio. Não nego o meu fascínio para com essa disciplina, apesar de reconhecer a dificuldade para entendê-la num primeiro momento. Hoje, o professor Erasmo explicou alguns mandamentos da lógica semiótica Greimasiana:

  1. Nada é o que parece ser, nunca;
  2. A consciência em si (a razão) é destinada para si;
  3. As coisas só têm significado se tiver valor. Caso não, passa despercebida mesmo aos olhos mais atentos;
  4. Ninguém se move se não por um interesse;
  5. Dualidade Aparência versus Essência;
  6. Desvelar (tirar o véu, relevar, mostrar a essência).

Logo depois aplicou na prática dando o seguinte exemplo:

“O cara vai a uma festa no fim de semana, mas desde quinta ele já está pensando na roupa que vai usar, para causar boa impressão com as gatinhas. Chega o dia da festa, o cara se arruma todo, se perfuma e parte para a balada à procura de uma presa. Ao encontrá-la, tenta chegar junto e para isso promove uma estratégia... Chega na moça, tenta parecer o mais interessante, inteligente, agradável, atencioso, estiloso e todos esses requisitos para despertar a atenção dela. Quando rola, trocam telefones e mais adiante o negócio se torna um relacionamento. Com o tempo, ela percebe que todos aqueles requisitos básicos de quando se conheceram não é bem aquilo que aparentava ser... Cai a aparência e fica a essência, o cara se mostra como ele verdadeiramente é.
Quando ela fizer o balanço Aparência versus Essência pode ser que: 1) a essência seja bem pior que a aparência e ela dê um chute na bunda do cara ou 2) percebe que a essência não é o que era a aparência, mas mesmo assim o cara vale a pena.
Caso ocorra a primeira alternativa, o cara entra em desespero. Não aceita e corre atrás da moça incansavelmente pedindo uma chance, e tenta a todo custo remontar a aparência... Que SEMPRE vai cair com o tempo, pois essência ninguém tira!”

Depois ele passou esse vídeo:



Segundo alguns psicanalistas quando se apaixona, você não se relaciona com alguém de carne e osso, mas com uma projeção criada por você mesmo; e a projeção que fazemos é de um ser absolutamente perfeito, mas depois de um período a projeção acaba e você passa a enxergar de verdade a pessoa com quem está se relacionando. Invariavelmente, algumas virtudes do parceiro ou da parceira vão embora junto com a projeção, outras ficam.
E se o que ficou de cada um for suficiente para os dois, a relação perdura, caso contrário, ninguém sabe o que faz o botãozinho ligar e iniciar uma nova projeção, mas fortes indícios apontam para um único e delicioso suspeito, o Serenata de Amor.


Conclusão:
O amor é inexplicável, mas tem umas coisas que você pode entender... Basta uma aula de semiótica!

quinta-feira, 10 de setembro de 2009

As Aventuras de Macunaíma no Festival Fora do Tempo

por Elva Vieira (elvavieira@msn.com)


Era uma noite de julho quente e úmida. A constelação Ursa Maior se movimentava estranhamente. As estrelas contemplavam a floresta, em especial num ponto que brilhava e emitia um barulho muito diferente dos bichos plantas e dos seres fantásticos que habitam a Amazônia. Como aquele ponto na mata era brilhante e intenso, se refletia nas constelações que por sua vez refletia seu brilho natural de volta. A Ursa Maior, temendo ter seu brilho ofuscado por aquelas luzes, se inquietou. Tentou chegar próximo da mata na curiosidade de descobrir o que estava acontecendo. E se mexia inquietamente até o momento em que desgrudou do infinito escuro chamado noite e caiu, caiu, caiu... E os primeiros raios já começavam a dar o ar de sua graça, anunciando a chegada de Vei, a Sol. É quando a constelação se transforma em Macunaíma, o herói de nossa gente que tenta uma aterrissagem esplendorosa sob o chão do Maranhão e juque! Cai sentado numa praia de água doce. – Ai que preguiça! Exclama nosso herói, com a mão nas costas doídas da queda.

Enquanto Macunaíma se levantava enquanto era possível ver os peixes no rio numa dança sincrônica anunciando a chegada de nosso herói. E tinha dos mais variados peixes de água doce. Tinha abotoadoas, aruanãs, barbados, bicudas, corimbatás, corvinas, dourados, jurupocas, matrinxãs, pacus, piaus-flamengo, piaus-três-pintas, piraíbas, piranhas-preta, tilápias, traíras e tucunarés. As aves sobrevoavam por cima de Macunaíma num murmurejo em coro. E tinha bavettes, cacatuas, calopsitas, canários, coleiros, curiós, lorins, mandarins, papagaios, periquitos e sabiás. Ele estava faminto. Cansado de comer poeira cósmica lá no céu, logo entrou na água e caçou um dos peixes dançarinos e o engoliu vivinho da silva, com espinha e tudo mais.

Macunaíma caminhou pela ilha e descobriu que estava numa festa dentro da floresta. O som estranho não parava de tocar, o brilho que ele assistia piscar e ofuscar eram as luzes coloridas que iluminavam pela noite. Ele avistou ocas enormes, uma delas tinha uma pirâmide mais alta que o Gigante Pietro Pietra e tinha muitos jovens. Tinha gente que parecia da sua tribo, filhos de mandioca e pretos retintos, assim como ele quando havia nascido. Mas nem todo mundo ali pertencia à selva não. Era gente de todos os cantos do Brasil! Tinha “bah”, “oxente”, “égua”, “é nois na fita, mano”, “demorô”, “fio” e uma infinidade de sonoridades de nosso país. O herói de nossa gente ficou encantado com tantas cunhãs bonitas e teve vontade de brincar com todas elas.

Nosso herói esqueceu do calor danado que faz quando é dia na Amazônia, da Vei, a Sol que brinca de fazer arder na pele dos homens. Deu um mergulho no rio. Avistou de longe uma cunhã da pele morena e cabelos cor do fogo se banhando. Temendo que fosse Currupira querendo de volta a carne de sua perna, nosso herói se aproximou faceiro e quando percebeu que não era a maldita Currupira deu um mergulho e beliscou as coxas da cunhã. A moça gostou e os dois brincaram algumas vezes no rio. E ficaram se rindo um pro outro.

Depois do banho, Macunaíma continuou andando pela festa que nunca terminava até avistar uma grande muiraquitã muito parecida com a que Ci lhe deu de presente, pintada na perna de um moço. Mas era uma pintura muito colorida grudada na pele e que não saía com suor, nem com muita água, esfregão e sabão. Era diferente das que a sua tribo pintava na pele com urucum. Nosso herói quis a muiraquitã pra ele, mas o moço disse que de lá a muiraquitã não saía, não. Macunaíma ficou injuriado e chispou correndo atrás do moço. Correram muito. Passaram pelo Piauí, Ceará e Pernambuco. Quando passaram pela Bahia, Macunaíma perdeu o moço de vista, mas logo o encontrou debaixo da saia da dona da banca de acarajé. Correram mais e mais durante toda manhã até se cansarem. O moço se escondeu por entre os arbustos da ilha, bem distante da beira da praia para descansar. Macunaíma encontrou o danado tirando um cochilo e juque! Deu uma mordida na perna do moço, arrancando a imagem com carne e tudo. Nosso herói amarrou o pedaço da perna em volta do pescoço com um nó muito forte pra não perder que nem fez com a muiraquitã de Ci. Mas o pedaço de carne contou pra ele que aquilo não era muiraquitã de verdade, apenas tinta e se chamava tatuagem. Macunaíma ficou injuriado. Mas olhou a sua volta e percebeu que quase todo mundo ali tinha tatuagens e agora ele também tinha a dele.

Passando por uma das ocas imensas, nosso herói encontra uma cunhã sentada no chão fazendo colares com sementes de açaí. Macunaíma estranhou a moça que era filha de mandioca... Tinha cabelo loiro e tão pixaim que eles cresciam e se uniam em pedaços que mais parecia um monte de cobras loiras. Nosso herói aproveitou a distração da cunhã, arrancou uma das cobras da cabeça da moça com osso de jaguatirica sem que ela percebesse e amarrou em sua cabeça. Na verdade as cobras alvas se chamavam dreadlocks. Macunaíma ficou feliz por ter aquele penacho de cabelo loiro como adorno.

No espaço onde ele estava, tinha música que dava vontade de dormir e bastante gente estava fazendo isso. Uns fumavam cigarros de cheiro doce e estranho que não era tauari e nem dos que vende em São Paulo - daqueles embalados e já bolados, prontinhos pra fumar. A fumaça que saía desses cigarros era tanta que parecia que a oca estava cheia de névoa. Macunaíma muito curioso pediu pra fumar também. Deu um trago tão profundo que ficou tonto! – Que preguiça! Disse o herói se sentindo relaxado e estranhamente anestesiado. Se deitou para tirar um cochilo.

Macunaíma entrou em sono profundo e sonhou com o Gigante Pietro Pietra. Acordou assustado. Pegou outro susto quando abriu os olhos e deu de cara com uma guria olhando e sorrindo pra ele. Macunaíma pulou bem alto que nem pulga de circo e atirou a menina no chão. A moça ria mais ainda. Nosso herói não entendeu a graça de tanta risada. – Que tu tanto ri, desgraça? Dizia nosso herói. A guria puxou Macunaíma pela mão e levou nosso herói pra outra oca que chamava de pista de dança. No caminho, nosso herói contou pra moça sobre o gigante comedor de gente e seu fim numa panela quente. Contou ainda que travou uma luta muito, muito sangrenta com o gigante e vencera graças às técnicas de luta oriental ensinadas por um louva-deus. A moça disse que existem muitos gigantes comedores de gente, mas a maioria mora em Brasília, atendem pelo pronome Vossa Excelência e governam o país. - Esses não roubam muiraquitã, roubam é dinheiro do povo! Disse a guria. Macunaíma teve uma vontade enorme que Jiguê tivesse ali pra transformar o mano em máquina telefone e xingar esses gigantes. Mas nem que ele estivesse... Nem sinal de celular pegava na ilha.

Os dois chegam na pista de dança e nosso herói vê um monte de gente pulando feito macaco prego, ouvindo uma música agitada feito bate estaca de frente para a pirâmide gigante. Dentro dela havia um Xamã, mas era um Xamã diferente que mexia em máquinas cheias de botões brilhantes e levavam som para umas caixas enormes e elas emitiam música e não era som de violão, nem de piano, nem de buzina. E era um som que hipnotizava as pessoas. Nosso herói chegou perto da máquina caixa de som e ficou abestalhado com tamanho barulho que saía delas. Macunaíma conhecia magia de macumba, magia de Manaape, magia das tribos indígenas, magia da natureza, mas magia de máquina de som era novidade. Passou o resto da tarde encostado numa das caixas e repensou se as máquinas eram realmente deuses. Logo a guria explicou que o Xamã é o DJ e é ele quem toca e produz essa música eletrônica. Nosso herói logo conclui: Não é sempre que a máquina briga com o homem e vice-versa porque toda aquela magia era resultado da união da máquina com o homem.

Já era noite quando nosso herói viu que seu lado tinha um velho e ele vestia uma camisa que brilhava no escuro. Macunaíma pensou que ele fosse um vagalume transformado em gente. E ele gostou bastante disso porque ele também brilha quando é estrela. Então ele perguntou ao velho qual tribo era aquela dançando, que ele nunca tinha visto, nem na Amazônia e em nenhum lugar. O velho respondeu que essa era a geração psytrance e saiu balançando o corpo pela pista ao som da música. Macunaíma não entendeu direito o que o velho vagalume quis dizer com isso. Minutos depois o velho vem sorrindo pra perto do nosso herói com uma das mãos fechadas e perguntou a Macunaíma se ele conhecia a psicodelia. Macunaíma achou que fosse algum tipo de inseto escondido nas mãos do velho e disse não conhecer. O velho pisou com bastante força no pé do nosso herói, que gritou bem alto enquanto o velho colocava o conteúdo das mãos na boca de Macunaíma. Nosso herói engoliu e ficou com muita raiva. Xingou o velho com três dúzias de palavras feias.

Macunaíma achou que tivesse engolido várias lagartas porque depois de algumas horas sentiu como se tivesse com três ou quatro borboletas na barriga. Depois vieram calafrios e arrepios na espinha, igualzinho ao que ele sente quando brinca com as cunhãs. Nosso herói começa a gargalhar incansavelmente ao ver todas as coisas brilhando e as cores mais intensas como nunca viu em toda sua história. A música tinha o cheiro da chuva. Depois ficou com o mesmo odor da peruca da dona da pensão que usou para se disfarçar de francesa para enganar o gigante. Depois teve cheiro da Oca onde morava com seus irmãos. Na boca do herói tinha gosto do suor de Ci, a mãe do mato. Olhou com saudades para o céu. Avistou a linda estrela em que ela tinha se tornado sorrindo pra ele, quase igual à lua crescente. Macunaíma saltou bem alto e abraçou forte a estrela. Nadou por cima da ilha onde havia uma baleia gigante que devorou nosso herói. Na barriga da baleia Macunaíma foi transformado em excremento e foi expelido como todo bolo fecal é expelido. Nosso herói caiu novamente na pista.

Quando olhou para suas mãos percebeu que ela, assim como todo seu corpo mudava de cor. Ficava verde, azul, rosa, roxo e todas as cores do arco íris. Passou muito tempo trocando de cor que nem camaleão e deu muitas gargalhadas por conta disso. As pessoas ao seu redor também estavam diferentes. Elas nem pareciam de verdade pois se derretiam na frente do nosso herói. Os objetos adquiriram olhos e não paravam de fitar Macunaíma, seguindo ele por onde ele passava. Uma vontade incontrolável de se mexer com a música contagiou nosso herói que se juntou à tribo naquele ritual. Macunaíma batia o pé tão forte no chão que toda a ilha estremecia com aquela energia que voltava para ele em forma de choques elétricos.

No rio, perto da beira da praia, Macunaíma avistou um grupo mulheres nuas que faziam malabares com fogo e Macunaíma disse que também sabia fazer isso. Disse ainda que lá no infinito de onde ele veio, ele faz a mesma coisa só que com cometas. Mas isso era outra mentira do herói porque lá no céu ele fica grudado, quase não dá pra se mexer. E foi por se mexer demais que ele acabou se desgrudando. Uma das cunhãs deu os malabares para Macunaíma e ele se queimou com a chama dos malabares.

– Criança que brinca com fogo, mija na cama! Gritava uma das moças e todas as mulheres nuas riram bastante de nosso herói que foi embora muito enfurecido.

Após algumas horas Macunaíma retorna a seu estado normal. Estava cansado das viagens e sensações que o velho vagalume havia lhe dado. Pensou que esse negócio de psicodelia era coisa forte, mas queria mais um monte dessas só que não agora porque nosso herói estava mui fadigado. Se aborreceu com o velho, com os gigantes que comem gente e moram em Brasília, com os telefones que não pegam, com as mulheres nuas, com a Muiraquitã tatuada e com toda essa gente estranha fazendo arruaça em plena floresta. Concluiu que esse mundo contemporâneo é demais estranho e prefere ficar observando tudo de lá de cima.

– Ai que preguiça! Exclamou Macunaíma olhando pro céu já querendo clarear. Nosso herói fechou bem os olhos e ainda com a feitiçaria de Piauí-Pódole abriu o peito com as próprias mãos fazendo escorrer todo seu sangue pela festa. As estrelas brotaram do sangue na areia da praia e subiram até se grudar novamente no infinito.

Muitas pessoas que estavam dançando na pista viram o herói de nossa gente se transformar em Ursa Maior, mas acharam que fosse alucinação conjunta porque estavam todas sob efeito de pílulas e papéis mágicos. Muitas delas até perderam a lembrança em seus devaneios. O único que acompanhou causo de verdade foi um pescador que assistia todas as peripécias de Macunaíma de longe, em sua canoa no rio, desde da queda até ascensão do herói. E o pescador contou o causo pro dono da barraca da feira onde vende seus peixes e ele contou pra esposa, que contou pra vizinha e ela contou pra sua irmã, que contou em uma viagem de ônibus para a minha tia e esta por último me contou. Mas não acredito, não! Sabe como é história de pescador...

segunda-feira, 31 de agosto de 2009

meu querido blog...

Por Elva Vieira (elvavieira@msn.com)

oi, eu sou a Elva e hoje acordei me sentindo bem. tão bem, mas tão bem que resolvi postar algo para marcar este dia ensolarado nesta joça aqui e espero do fundinho do meu coração que eu permaneça no mesmo pique e disposição que estou agora. hé, acordei bem porque não senti nenhuma dorzinha, nenhuminha mesmo e isso significa que não terei que voltar ao hospital para ser internada. e hospital é um lugar muito chato e entediante, exceto a ala de endoscopia (me sinto numa rave quando estou lá, todo mundo doidão) e quando lhe dopam para melhorar a dor. nada de expurgações, graças a deus. emagreci três quilos em uma semana e essa é a parte boa de estar doente. estou sem beber há oito dias, isso é um recorde. e estou parando de fumar.
lembro que quando era pirralha eu curtia ficar doente para não ter que ir para a aula. hoje eu fujo do hospital para poder ir para a aula, que recomeça hoje (já estava com saudade da minha turmitcha).
e por falar em estudos, estou feliz em voltar pras minhas neuras diárias, meus relatórios e artigos.. ai meu deus, tá tudo atrasado.
ah sim, minha orientadora viaja esses dias para fora do país, daí terei orientações via msn por tempo indeterminado (ciberespaço para que te quero!) mas isso é o de menos!
falando em ciberespaço, estou feliz por ter sido convidada por dois sites para escrever neles :)
ai, rotina, já disse que me deixas louca mas eu te curto para caralho?!

Notas:
1 - os médicos não descobriram ao certo o que eu tenho e a essa altura eu também não quero mais saber.
2 - gostaria de esclarecer que não farei deste blog um diário, visto que as duas últimas postagens foram de cunho pessoal, mas foram posts para desabafar. sabe como é, não é?

segunda-feira, 6 de abril de 2009

notas acerca do meu mundo feminino parte I

admiro mulheres que saem de casa todo dia com um salto fino nos pés, que não tiram da bolsa um estojo com todas as cores de maquiagem existentes, as opacas, as cintilantes. as que não conseguem sair sem um brinco pesadíssimo, sem batom ou brilho labial. as que se apertam em decotes, calças coladas. as que adoram estar em um salão de beleza escutando aqueles papos chatos de novela, as que aguentam o calor e o barulho de um secador. as que se olham todo dia no espelho, analisando milimetricamente seu corpo e sempre encontram uma gordurinha para se queixar o resto do dia. as que conseguem se sentir bem numa roupa cheia de cores, flores. as que têm o cosume de ir em boates e se emperequetar com todos aqueles brilhos, poses e cabelos chapados. as que mantém Deus no ceu e sua franja intacta na terra, amem. as que experimentam dietas furadas toda segunda feira.

a elas eu admiro, não invejo. imagino que devam gastar muito tempo e dinheiro para se sentir bem e bonitas, afinal todas temso direito, não é? o meu tempo e dinheiro, bem, eu invisto em outras modalidades de se "sentir bem" e gosto do resultado.

posso ser "esculhambada", sim, mas não menos vaidosa do que essas mulheres. vaidade não é apenas algo estético, há muito mais que isso, é algo que tem a ver com caráter, reputação, reconhecimento. não sei exatamente se o que eu acho é o certo, na verdade não existe certo ou errado, existem diferentes visões e referenciais. msendo assim, não me considero menos mulher e menos feminina por isso, apenas diferente :)